
"Películas" é o nome do livro de poesia que empresta o nome ao filme-ensaio realizado a partir da vida e obra de Luís Miguel Nava (LMN) – Poeta homossexual, nascido na conservadora cidade de Viseu, morto em Bruxelas, e cuja magnifica obra poética é desconhecida pela maioria dos viseenses.
Película é uma pele muito fina ou superficial, algo que reveste o corpo humano, mas é também o que está por baixo dessa pele, todo o organismo que não podemos ver. É uma fina camada de gelatina que reveste filmes, filme de cinema. A partir dos arquivos de filmes de super 8 da minha família e de excertos do filme “Un chant d'amour” (1950), de Jean Genet, constrói-se um “corpo” marcado por memórias, por várias peles, as películas de Nava, pelos seus poemas e pelas suas paisagens.
“Películas”, o seu primeiro livro de poesia, serve de inspiração para este filme, cuja narrativa é adensada pelas trevas expelidas do "Vulcão", o seu último livro. Cada película, cada imagem, cada poema, cada paisagem remete-me para os lugares que mais me são caros: a praia, o mar, o sonho e a liberdade.
Este filme é a minha carta de despedida para LMN, a carta de alguém que não teve a oportunidade de o conhecer.
nota de intenções
O meu primeiro contacto com a obra de Luís Miguel Nava (LMN) surge com a participação na residência artística O Corpo e as Linguagens, a partir da obra de LMN. Numa primeira pesquisa, deparei-me com o seu primeiro livro, intitulado “Películas”. É daqui que surge o primeiro interesse e fio condutor para este filme que remete para o cinema, para a imagem em movimento, para uma memória de um cinema em película que não existe mais.
Recuperei alguns arquivos de filmes de Super 8 da minha família e excertos do filme “Un chant d'amour” (1950), de Jean Genet, para construir um filme-ensaio sobre a vida e obra do jovem poeta viseense.
Durante o processo de criação do filme percebi que a sua homossexualidade é ainda um assunto tabu em Viseu e que é ainda um desconhecido para a generalidade da população. E, sendo esta uma cidade ainda muito conservadora, decidi escrever uma carta a LMN, uma homenagem através de imagens pessoais e da minha visão sobre a cidade e da minha interpretação da poesia de Nava.
“Películas” é um filme sobre LMN, mas é também um filme muito pessoal, sobre a procura da liberdade, sobre a vontade de tornar Viseu uma cidade mais livre. Por quanto tempo mais irá Viseu remeter Nava para o esquecimento, para o vazio? Que estas películas, que também são do Nava, não caiam no esquecimento. Uma das frases mais belas do Maio de 68 dizia: “sob a calçada a praia”. Ou seja, por baixo das pedras está a praia, o mar, o sonho, a liberdade.